terça-feira, agosto 13, 2019

Conto: Golpe em Lailath - Gabriel G. Sampaio 2016


Golpe em Lailath

Autor: Gabriel G. Sampaio
São Vicente, Baixada Santista, São Paulo

Um Crauler  era como os humanos de Lailath chamavam os habitantes originais do planeta Rwaist, na orla externa da Galáxia.

Os humanos haviam chegado lá nos anos finais da Guerra dos 300 anos e, à partir daí, mataram, escravizaram e humilharam o povo daquele mundo.

Diziam que eram ralé, sujos e ignorantes. Que só serviam para trabalhar, nunca para pensar.

Gousdal D’vion era um Crauler que nunca aceitou isso, mas como tinha nascido e crescido em escravidão, viveu boa parte de sua vida conforme as regras da sociedade. Com o passar do tempo, ele viu ideias novas surgindo. Ideias de igualdade.

Quando sua mãe morreu de uma doença com 45 anos, embora sua resistente raça vivesse em média até os 130, Gousdal revoltou-se e fugiu. Foi viver à margem da sociedade Rwaist. Seus últimos 20 anos de vida foram dedicados ao trabalho de libertar e ajudar outros Craulers, sempre de forma pacífica.

D’vion nunca pegou em armas para enfrentar os humanos opressores.

Houve muitas oportunidades para este Crauler visionário vingar-se de seus escravizadores, mas ele nunca o fez. Nunca se entregou ao ódio. Ensinou a seus filhos e netos, nascidos livres, que eles deveriam sempre lutar com a mente e com a fé, nunca com o corpo. Já idoso, tornou-se um escritor.

Assim os Humanos de Lailath viram em alguns séculos de convivência, os Craulers se erguendo, se organizando e virando o jogo.

Espertos e cheios de esperança, os nativos de Rwaist souberam entrar no jogo dos colonizadores. Após revoltas, sofrimento e muita diplomacia, tomaram a dianteira na pseudo-democracia Lailathiana. Foi uma conquista longa e árdua, fruto do trabalho de muitas vidas, de pequenos e grandes líderes. Mas em geral, foi um esforço diário, construído no dia-a-dia das relações de trabalho entre as duas raças.

Com o tempo, alguns líderes dos Craulers chegaram ao poder e, mesmo sem grandes méritos pessoais, colocaram em prática ações que atenuaram a exploração do povo sofrido de Rwaist.

O bisneto de Gousdal, Kor-vag D’vion foi um dos que testemunharam este momento histórico de Lailath. Embora ainda houvesse muito sofrimento e tristeza para seu povo, ele também evitou a violência contra seus opressores.

Mas os humanos colonizadores não deixaram barato estas conquistas. Com conspirações e manobras traiçoeiras, eles voltaram ao poder. Fizeram de tudo para tirar o pouco que os Craulers conseguiram para si. Apenas para se sentirem mais especiais do que os seres com quem dividiam aquele mundo.

— Pensam que nos venceram, mas estão enganados. — disse o líder Crauler que foi traído.

Parecia que a vez os Craulers tinha acabado, que eles voltariam aos pés dos antigos escravagistas de Lailath, mas os Craulers não desistiram. Houve resistência.

Foi neste momento, seis gerações depois de Gousdal, e onze depois da colonização de Lailath, que um Crauler finalmente abraçou a luta armada. Esta foi Almdi D’vion — uma guerreira forjada da violência nos guetos das cidades híbridas de Rwaist.

A teimosia, a determinação e a vontade inabalável dos Craulers, começou a dar resultados. Então, depois de uma guerra civil em que humanos e Craulers lutavam dos dois lados, depois de uma geração inteira que nasceu e viveu entre batalhas, bloqueios e a miséria da guerra, os Craulers superaram seus opressores, se tornando os senhores deste que é hoje um dos Reinos estelares mais resistentes da galáxia!

Aos 90 anos, Almdi D’vion ainda fez mais, liderou a expulsão da elite fascista do sistema e ajudou a sociedade mista de Lailath a executar uma reforma social e econômica como nunca vista. A era da segregação e exploração finalmente acabou naquele sistema solar.

Já os humanos opressores, que se achavam seres superiores, foram aos poucos esquecidos, tendo seus nomes limados de todas as crônicas daqueles mundos.


– Da Enciclopédia de História Galáctica.

Esta história se passa cerca de 2 mil anos antes da Guerra do Exídio, contada no livro “Exídium”.

Sobre o autor:

Gabriel G. Sampaio
Gabriel G. Sampaio é professor, especialista em Tradução e escritor. Já dirigiu um cineclube escolar e desenvolveu trabalhos de iniciação literária na prefeitura de Cubatão. Desde 2014 viaja o Brasil para expor seus livros e falar de seu amor pela literatura.

Cinéfilo e louco por Ficção Científica, vive em São Vicente, no litoral paulista. Foi finalista do prêmio Cubo de Ouro 2018 em Literatura Geek, com o livro ilustrado “Exídium”. Escreveu uma aventura sobre os últimos Lobisomens – Warwolf: O Ritual – e o roteiro do quadrinho “Exceção Hostil”. Também foi selecionado para compor vários livros de contos, nos gêneros Terror, Fantasia e Ficção Científica.

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